Depois da convocação à Seleção Brasileira, o goleiro Hugo Souza comoveu os torcedores com uma carta especial. Publicado no The Players’ Tribune, o texto “Os Sonhos do Meu Pai” é uma homenagem ao seu Jorge, pai do goleiro, que faleceu em 2020.
Escrita em primeira pessoa, a carta mistura desabafo, reflexão e uma conversa simbólica entre pai e filho. Hugo revisita toda sua trajetória: a infância difícil em Duque de Caxias, as passagens por Vasco, Flamengo, Portugal e o momento de glória no Timão.
No Corinthians, ele reviveu grandes emoções. Um dos pontos altos da carta é quando narra, como se estivesse contando ao pai, os dois pênaltis defendidos contra o Palmeiras no Paulistão de 2025.
No primeiro, contra Estevão, na fase de grupos, o jogo terminou 1 a 1 na casa do rival. “Eu voei na bola e defendi o pênalti, que imediatamente passou a ser classificado como mal batido”, escreveu. “Eu sei, você me avisou que seria assim, ninguém reconhece o goleiro.”
O momento mais marcante veio na final. Hugo defendeu o pênalti de Raphael Veiga e ajudou a garantir o título para o Corinthians, encerrando um jejum de seis anos sem troféus. “Ser jogador do Corinthians é saber que a cobrança será equivalente ao apoio que a Fiel vai nos dar antes, durante e depois dos jogos. Naquele momento, eu estava concentrado. E podia ouvir a torcida, que não parava de gritar. A atmosfera já estava diferente. Veiga ajeitou a bola. Tomou distância. E correu para bola: ‘Não, Veiga, hoje ninguém vai fazer gol aqui. Não comigo no gol”.
“Chorei muito. Do começo, quando nem sabia o que era ser goleiro. Das dificuldades com a troca de clube, da passagem do futebol de salão para o futebol de campo. Da falta de dinheiro e do seu esforço para que o nosso sonho não fosse em vão. E acima de tudo, pai, eu me lembrei de você”, descreve Hugo as sensações ao final daquela partida que consagrou o Corinthians campeão após seis anos sem taças.
A carta é uma espécie de volta no tempo. Hugo conta que virou goleiro por acaso, aos cinco anos, na escolinha do Vasco. Era a única posição disponível. Seu pai, apesar de considerar o gol uma “posição ingrata”, sempre o apoiou.
Jorge acreditava no talento do filho. Mesmo quando o Vasco dispensou Hugo na transição para o campo e a ajuda de custo acabou, ele manteve a fé. O goleiro ainda lembra com carinho que o pai recusava convites para jogos varzeanos porque queria que o filho focasse em clubes grandes.
Depois da saída do Vasco, o destino quis que ele fosse parar no maior rival: o Flamengo. Lá, começou recebendo só o dinheiro das passagens, mas era o suficiente para reacender a esperança da família. Se destacou na base, foi convocado para a Seleção Sub-17 e celebrou essa conquista com o pai — uma das últimas grandes alegrias dos dois juntos.
A estreia como profissional veio já sem Jorge por perto, contra o Palmeiras, pelo Brasileirão de 2020. O empate por 1 a 1 foi tratado como vitória por Hugo, que enfrentava o luto e as lembranças de uma infância dura.
Mas a carreira teve altos e baixos. Depois de falhas no Flamengo, foi emprestado ao Chaves, de Portugal. “De Duque de Caxias para Portugal. Fiz o caminho do exílio”, escreveu.
Foi então que veio a reviravolta. Uma ligação de Fabinho Soldado, dirigente do Corinthians, mudou tudo. Em julho de 2024, Hugo desembarcou no Parque São Jorge. Havia desconfiança, mas ele estava disposto a dar a volta por cima, e conseguiu.
A torcida, a Neo Química Arena, os títulos e a saudade do pai formam hoje o cenário de um goleiro maduro, grato e inspirado. “Toda vez que entro em campo, sinto o orgulho do meu pai lá de cima”, diz Hugo.
A carta termina com uma despedida que carrega tudo que essa jornada representa:
“A saudade é imensa.
Do teu filho,
Hugo.”